terça-feira, 30 de setembro de 2008

Refletindo sobre os ensinamentos de Jesus

O blog Inagata, que está na minha lista de favoritos, publicou anteontem uma postagem sobre duas recomendações de Jesus, em dois capítulos diferentes do Evangelho de Mateus. Com todo respeito ao articulista, que traz várias questões dignas de investigação e que só são ignoradas por aqueles que têm medo de pensar e perder a fé – pois que, para mim, a fé deve sim ser confirmada pela razão -, começo aqui minha resposta.

A Bíblia foi, de fato, modificada, alterada, e não sabemos, de fato, seus verdadeiros autores. A única coisa que fica clara é que seus livros foram inspirados por espíritos, de diferentes graus evolutivos, isto é, mais ou menos puros. Contudo, a interpretação literal dos evangelhos faz-nos perder as grandes lições espirituais e de moral, que são mostra da verdade universal ali contida.

A comparação de trechos diferentes para estudarmos e procurarmos entender se há verdade em algum deles é de fato útil. Inútil, no entanto, seria levarmos tudo que lemos ao pé da letra, como fica claro ao começarmos pelo primeiro livro, a Gênese, que mostra Cain indo para outra terra e casando com uma mulher que, certamente, não poderia ser sua irmã - a própria ciência nos confirma que, geneticamente, isto seria altamente perigoso e traria homens cada vez menos protegidos contra doenças e propensos a nascerem com deformidades.
Com isso em mente, eis os trechos citados, agora dentro do contexto, de acordo com a tradução de C. Torres Pastorino, no livro "A Sabedoria do Evangelho":
Mt. 5: 20-26


 21. Ouvistes o que foi dito aos antigos: "não

matarás" e "quem matar, estará sujeito ao

julgamento".

22. Mas eu vos digo que todo o que se magoa

contra seu irmão, estará sujeito a julgamento;

e quem chamar seu irmão "tolo", estará

sujeito ao tribunal; e quem chamá-lo “louco",

estará sujeito ao vale dos gemidos de

fogo.

23. Se estiveres, pois, apresentando tua oferta

no altar e aí te lembrarás de que teu irmão

tem alguma coisa contra ti,

24. deixa ali tua oferta diante do altar, vai primeiro

reconciliar-te com teu irmão e depois

vem apresentar tua oferta.

25. Sê benevolente depressa com teu adversário,

enquanto estás no caminho com ele;

para que não suceda que o adversário te entregue

ao juiz, o juiz ao oficial de justiça, e

sejas recolhido à prisão;

26. em verdade te digo, que não sairás dali até

pagares o último centavo.




Mt. 23:17




13. "Mas ai de vós, escribas e fariseus hipócritas!

Porque fechais diante dos homens o reino dos

céus; e nem vós entrais nem deixais entrar os

que estão entrando.

15. Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! Porque

rodeais o mar e a terra para fazerdes um

prosélito; e quando feito, o tornais filho da geena

o dobro de vós.

16. Ai de vós, guias cegos! que dizeis: quem jurar

pelo templo, nada é; mas quem jurar pelo ouro

do templo, fica obrigado.

17. Néscios e cegos! Pois qual é o maior, o ouro ou

o templo que santifica o ouro?




Ambos os trechos são apenas contraditórios com uma interpretação restrita, e não contextual (Mt. 5: 20-26). O primeiro contexto mostra três níveis de ofensas que afastam o homem da espiritualidade:


 1 – A mágoa, que é o resultado do orgulho ferido. O julgamento se entende à ação individual, pois é uma revolta, e a pena é o próprio sofrimento que advém dessa dificuldade em perdoar ou esquecer. Deus não pune ninguém como faria um carrasco e como acreditam muitos, mesmo sem pensarem sobre isso.

2 – A ofensa leve, que coloca o homem sob o julgamento dos homens. Não se deve pensar que por que alguém chama outro de tolo deve ser levado a rígido julgamento, isso seria pensar numa coisa sem lógica, avessa à inteligência.

3 – Tudo que fazemos de realmente mal para ofender o outro, não apenas com palavras, isso é uma falta grave. A conseqüência é o sofrimento no Geena (como diz o original), o “vale dos gemidos de fogo”, o que, de acordo com a doutrina espírita, parece ser uma referência ao retorno à Terra por meio de reencarnações sucessivas, nas quais a pessoa guarda responsabilidade pelas ações anteriores, de outras vidas. Outra interpretação também pode ser o tempo que o homem passa no umbral, sofrendo antes de poder reencarnar.


No segundo trecho, portanto, temos um Jesus falando duramente e apontando os vícios dos homens, com a autoridade moral que tinha para tal. De forma alguma, no entanto, ele calunia ou fala diretamente aos que censura. Além disso, sejamos sensatos, quem não concorda que, quando for para o benefício do bem, o mal deve ser apontado e, sim censurado?


 Eis o que nos diz a codificação de Allan Kardec no Evangelho Segundo o Espiritismo (Capítulo X):


 21. Há casos em que seja útil revelar o mal de outrem?

Essa questão é muito delicada, e é aqui que é preciso apelar para a caridade bem compreendida. Se as imperfeições de uma pessoa não prejudicam senão a ela mesma, não há jamais utilidade em fazer conhecê-las; mas se podem causar prejuízos a outros, é preciso preferir o interesse da maioria ao interesse de um só. Segundo as circunstâncias, desmascarar a hipocrisia e a mentira pode ser um dever, porque vale mais que um homem caia, do que vários se tornarem enganados ou suas vítimas. Em semelhante caso, é preciso pesar a soma das vantagens e dos inconvenientes. (SÃO LUÍS, Paris, 1860).
Eis outro trecho dos evangelhos que complementa e explica melhor a questão das ofensas:


 Mat. 12:31-37


 31. Por isso digo-vos: "Todo erro e má palavra

será relevada aos homens; mas a má palavra

do Espírito não será relevada.

32. E quem profira um ensino contra o filho do

homem, lhe será relevado, mas o que diga

contra o Espírito Santo não lhe será relevado

nem neste ciclo nem no vindouro.

33. Ou supondes a árvore boa e seu fruto bom,

ou supondes a árvore má e seu fruto mau;

porque a árvore é conhecida pelo fruto.

34. Filhos de víboras, como podeis falar boas

coisas, sendo maus? porque da abundância

do coração a boca fala.

35. O homem bom do bom tesouro tira coisas

boas, e o homem mau do mau tesouro tira

coisas más.

36. Digo-vos, pois, que qualquer palavra inútil

que tenham falado os homens, darão conta

desse ensino no dia da discriminação.

37. porque por teus ensinos serás justificado e

por teus ensinos serás condenado".


 Nesta lição vemos que tudo que é falta trivial dos homens será relevada, pois somos imperfeitos e em evolução aqui na Terra. Aquilo, no entanto, que for ofensa grave contra os homens ou contra Deus, essas terão de ser pagas, de acordo com a lei de causa e efeito que obriga o homem a pagar, nessa e nas vidas seguintes, o mal que faz a outrem.

Claro é, portanto, analisando a coerência entre os ensinamentos de Jesus, que é lícito condenarmos o mal quando prejudicar outrem, e que aquilo que nos faz mal será ou não relevado por Deus de acordo com a gravidade.
De maneira alguma Jesus poderia estar apenas falando de palavras em Mt. 5: 20-26, pois os ensinamentos dele são muito maiores do que isso.
Obrigado amigo da Inagata pela possibilidade da reflexão, e que a paz de Deus esteja contigo!

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